Haydn/Wynton Marsalis e a magia da trompete
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Foi no passado sábado. Em Washington. Mas também em Nova Iorque. Protestaram contra o racismo e a impunidade de crimes contra cidadãos americanos de cor negra. Foram muitos milhares.
António Modesto Navarro, excerto de artigo publicado no jornal Avante, de hoje.
Se achar que precisa voltar,
volte. Se perceber que precisa
seguir, siga! Se estiver tudo
errado, comece novamente.
Se estiver tudo certo, continue.
Se sentir saudade, mate-a.
Se perder um amor, não
se perca! Se o achar, segure-o!
Circunda-te de rosas, ama,
bebe e cala. O mais é nada.
Não é do livro do José Sequeira Gonçalves que falo. É dos militares que em Dezembro, ao longo dos 13 anos da guerra colonial tinham direito de antena na RTP para expressarem as suas mensagens de boas festas, dirigidas aos seus familiares e amigos. Formavam filas e, um após outro debitavam, geralmente a "correr", o seu desejo de feliz natal e próspero ano novo mais "adeus até ao meu regresso", que para muitos foi dentro de uma caixa de pinho. Também estive na guerra - na Guiné - mas não fui contemplado com o tal "direito de antena", já que a minha unidade não foi visitada pelas equipas de recolha das tais mensagens. Mas, caso tivesse havido essa oportunidade, provavelmente (se escolhido) não resistiria a entrar na fila. Assim, nos meus dois natais de Guiné, limitei-me ao clássico aerograma enviado via SPM (serviço postal militar).
A tradição do canto polifónico praticado na Córsega será talvez, a que mais se aproxima do nosso cante alentejano. Há até investigadores que admitem a ideia de o canto corso ter chegado ao Alentejo, trazido por religiosos franciscanos, sendo a partir dele que os rurais alentejanos criaram o seu cante. Mas, tal tese não consegue provar que assim foi, por isso permanece a par de outras hipóteses também existentes, continuando a ser não rigorosamente precisa uma origem para esta forma única de cantar. Como certo pode ter-se que o cante alentejano foi obra das trabalhadoras e dos trabalhadores rurais alentejanos, em tempos muito recuados e mantendo-o intacto por transmissão oral.
Não é possível respirar na América porque a falta de ar transcende todas as esferas da vida humana. Os imigrantes ilegais ameaçados com deportações não podem respirar; as famílias endividadas e ameaçadas com despejos sentem-se sufocadas; os trabalhadores que recebem um salário mínimo insuficiente para sobreviver sentem-se asfixiados. O movimento de massas que se está a formar é de todos eles.
Na atmosfera democraticamente rarefeita dos EUA persiste a segregação legal, a discriminação institucional e o racismo estrutural. É uma doença que não se cura com panaceias verbais nem paliativos legais. O racismo (enquanto actual opressão sistémica) nasceu com o capitalismo e não poderá desaparecer enquanto um homem explorar outro homem. É preciso levar para a margem o negreiro encalhado dos Igbo, destruí-lo, e construir um navio novo. Porque, no fundo, a História da América é um disco riscado pelo racismo: pode dar todas as voltas do mundo, mas enquanto o sistema for este e o disco tocar o mesmo, a injustiça continuará a arranhar-nos os ouvidos, a cortar-nos a carne e a impedir-nos de respirar.
António Santos, parte de artigo publicado no jornal Avante! de hoje
Ontem dei a palavra a Urbano Tavares Rodrigues que falou dos "ratinhos". Literatura de alta qualidade. Coisa séria. Hoje, é uma brincadeira, tenho eu a palavra para apresentar a rata, novo modelo em vias de ser adoptado para substituir o indispensável rato no uso do computador.
(recebido por correio electrónico)
Foi com a Adelaide, de carrinha, ver os "ratinhos" na ceifa. Parecia um dia de Agosto. O sol ofegava, em chamas claras, no suão escaldante sobre as piorneiras emaranhadas, de onde se levantavam os tordos e as cotovias, junto à carreteira, e os trigais ondulantes ardiam na vesâmia da manhã rubriloura, opressa de calor, Alguns trinta e muitos graus à sombra, perto de quarenta... Uma das raparigas da Beira, já lhe dera um "badagaio", por causa daquela calma. "Não estão avezados" - explicava o Queixada, enquanto lhe ia borrifando a face com água, suspendendo-se amiúde para aventar bolegadas a um perro vagabundo, que teimava em acercar-se da chanfana que um dos "ratinhos", muito vermelho e desabotoado, estava preparando ao lume para o almoço. Eram quase todos baixos, malfeitos, de perna curta, troncudos, grandes cabeças de lusitanos, como estátuas românicas, mas o sorriso aberto, o olhar vivo malicioso, a palavra fácil. "Salve-as Deus", "Deus vos ajude" - cumprimentavam os mais velhos. Nem aquelas saudações faltavam. Teresa conhecia bem aquele tipo humano, que comia e dormia com o gado nas suas aldeias de pedra e penava sem desfalecimento para amealhar dinheiro, para educar os filhos, para acrescentar as suas leiras. Gente dada, de bom convívio, gente de aço e de borracha, dócil e tenaz, geba mas esperta, sabendo viver com Deus Nosso Senhor e com os seus interesses. Gente forte e humilde da sua terra, apta para todas as fainas. Também ela era da mesma massa. Sentia-se fisicamente canhestra e espessa como eles. O Queixada, no meio dos "ratinhos", de jaqueta ruça, delgado, torneado, o nariz adunco e nervoso, os lábios finos, o pescoço alto, uma nuca perfeita, sob o lenço esvoaçante que a protegia do sol, parecia um príncipe do deserto, de outra raça, mais fechada, mais bela e mais triste.
Urbano Tavares Rodrigues, em O "Monte" das Rosas
Os "ratinhos" eram os trabalhadores das Beiras, contratos pelos grandes latifundiários do Alentejo e Ribatejo, constituindo "ranchos" mais ou menos numerosos para trabalhos sazonais da monda e da ceifa. Era um recurso dos grandes agrários para não pagarem aos trabalhadores locais os salários que reivindicavam. A presença dos "ratinhos" - no Ribatejo eram chamados de "gaibéus" - gerava tensão e hostilidade, já que estes sujeitavam-se a baixos salários, afectando por isso a acção reivindicativas dos alentejanos e ribatejanos.
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